blog
domingo, 29 de janeiro de 2012
Só um jogo de palavras...
Na vida, muitas palavras soltei que não voltaram,
Outras chegaram sem eu pedir,
Desejei ouvir palavras que ninguém disse,
Tantas outras declarei - e ninguém quis!
sexta-feira, 27 de janeiro de 2012
Só uma parte da história
A vida nem sempre é o que sonhamos, nem o que acreditamos ser verdade. Nossos olhos vêem pequenas partes do todo e nunca a história integral. Mesmo sabendo disso, sua mente sentiu-se atraída pela imagem à sua frente. Na plataforma vazia da estação de trem um rapaz aguardava. Tinha expressão séria, reforçada pelos óculos de lentes escuras, quase pretas. O contexto lhe pareceu intrigante e, inevitavelmente, atiçou sua imaginação. Naquele rosto jovem e bonito havia uma história a ser contada, mesmo que não fosse possível decifrá-la apenas com o olhar. Suspirou, enquanto seus olhos vagavam pelo local. Com tempo disponível para criar, começou a tecer conjecturas.
Que circunstancias e fatos haviam conspirado para criar aquele momento? Que motivos teriam levado o rapaz até aquela cidade? Por que estava ali sozinho? Teria se atrasado para o horário de partida do trem? Ou simplesmente havia se antecipado? Teria deixado para trás alguém triste com a sua partida? Ou teria alguém ansioso a esperar por ele em outra plataforma do caminho? Teria vindo até ali por um amor, um trabalho ou um amigo? Ou partia em busca de seu amor, cansado da própria solidão? Voltava ao seu ponto de partida? Ou partia dali para ganhar o mundo?
Naquela simples imagem havia causas e consequências a avaliar... Ela lhe fez lembrar um episódio semelhante, que parecia a cena de algum filme ou de uma história esquecida no tempo.
“Ele desceu do trem apressadamente, desviando-se das pessoas que se amontoavam ao longo da estação. Olhava atentamente os rostos que passavam ao seu lado. Parecia estar à procura de apenas um, que ainda não conseguira encontrar. Olhou de um lado para outro, com olhar quase angustiado. Indiferente à ansiedade expressa em seu olhar, a plataforma começou a se esvaziar pouco a pouco. Depois de alguns instantes, pareceu aceitar os fatos e dispôs-se a esperar. O som ritmado do telex, que saia de alguma das portas que se abriam para o saguão, quebrava o silencio de tempos em tempos. Depois de alguns instantes, recostou o corpo contra a parede e aquietou-se, equilibrando-se ora em uma perna, ora em outra. Depois, tirou um papel dobrado de seu bolso e abriu-o cuidadosamente. Seus olhos detiveram-se em algum ponto, com se quisesse certificar-se de algum pequeno detalhe que lhe passara despercebido. Seu semblante pareceu suavizar. Tudo indicava que seu conteúdo era a causa para estar ali – talvez, um apelo impossível de ser ignorado.
Em certo momento levantou rapidamente o rosto, como se tivesse pressentido uma presença. Seu olhar cruzou com o olhar da moça que caminhava em sua direção. No mesmo instante seu semblante desanuviou. Ainda permaneceu imóvel algum tempo, como se não soubesse o que fazer - ficava onde estava, caminhava ao encontro dela ou corria, com a mesma pressa que sentia seu coração? No rosto da mocinha surgiu um sorriso tímido, como se também estivesse insegura quanto ao que deveria fazer. Até que os dois se desarmaram e aconteceu o abraço, o beijo, misturado com lágrimas de alívio e felicidade. Neste exato instante se ouviu o trem apitar distante, avisando sua passagem.”
De volta à cena presente, ela olhou mais uma vez para o jovem desconhecido. Nesse exato momento ele se virou, como se alguém tivesse chamado seu nome. Um grupo barulhento de jovens caminhava em sua direção, conversando e gesticulando animadamente. Um grande sorriso surgiu no seu rosto! Logo todos estavam reunidos e suas vozes alegres preencheram o silencio da plataforma.
Aos poucos começaram a chegar novos passageiros. O trem apitou à distância, anunciando sua chegada!
quinta-feira, 26 de janeiro de 2012
O que resta do tempo
Durante os primeiros anos de nossa vida contamos o tempo pelo já vivido, comemorando entusiasticamente cada novo período, como prova irrefutável de realização e amadurecimento.
Porém, em certo ponto desse gráfico ascendente a escala muda e nossa idade passa a ser inversamente proporcional ao tempo vivido. Mais passa a ser menos, pois não sabemos quanto resta do tempo a nosso favor. Neste contexto, só nossa pressa de viver fica maior e lutamos para deixar as firulas de lado. O tempo é cada vez mais escasso para emprega-lo com quem não quer ou o que não se pode mudar.
Talvez seja por isso que perdemos aos poucos o medo de arriscar, de errar, de dizer o que pensamos e sentimos. Até de pedir o que desejamos, de compartilhar o que temos, de sonhar os sonhos que nos restam - já aprendemos a aceitar que nem tudo se torna realidade em nossa vida. Como ressalva, melhor não fazermos promessas que não poderemos cumprir e planos a longo prazo que não teremos tempo de alcançar. Em todos os casos, já pagamos antecipadamente por todos esses itens!
Algumas lembranças do amor...
Abraço protetor da mãe, quando vinha o medo
A voz firme do pai que ensinava o certo
Conselho dos mais velhos, nas encruzilhadas da vida.
Roupa nova para os domingos de criança,
Mingau de fubá com queijo minas
Cama arrumada e quentinha no inverno.
O primeiro beijo de amor,
O primeiro poema, inspirado e recebido.
A rosa, de um ramalhete único, guardada num livro.
Carregar os filhos recém-nascidos no colo,
Ver-se retratada nos rabiscos de uma criança.
Festa surpresa de aniversário, preparada pelos filhos.
Homenagear a terra natal num poema.
Ouvir uma música, de um outro tempo
Lembrar-se com carinho de alguém querido.
Presença de amiga para dividir a dor,
Abraços para multiplicar a alegria,
Risadas de presente para a vida.
Conversas intermináveis entre almas irmãs
Trocar a tristeza, por um pensamento mais feliz
Dizer a palavra desejada por um outro coração.
Conto: Fruta no pé
O amor pela pretinha vem de longe, desde os tempos da infância, passada nas ladeiras de Diamantina. O gosto talvez tenha sido aprendido com a mãe, que também morria de amores pela fruta. Quando as primeiras chuvas caiam na serra, contavam-se os dias para que elas amadurecessem e as gentilezas entre amigos começassem nas terras mineiras. A chácara de uma amiga de sua mãe era seu verdadeiro paraíso e o convite para saborear a fruta no pé era recebido com festa! Diante das árvores cobertas desde o tronco das frutinhas pretas, ela corria de lá para cá, experimentando e identificando as diferentes doçuras de cada uma. Tentava se fartar daquela polpa esbranquiçada e doce, para aproveitar bem a oportunidade que, afinal, só voltaria a acontecer no próximo ano ou na chácara do próximo amigo dos pais e irmãos!
A infância ficou para trás, a mãe partiu, as serras de Minas foram trocadas pelo horizonte retilíneo do planalto. Só o gosto pelas jabuticabas permanece até hoje e por ele se dispõe a fazer loucuras, já distante da abundância e da cortesia mineira. Quando o acaso lhe traz alguma oportunidade de saboreá-las, não a deixa escapar!
Lembra-se de um fato pitoresco, ocorrido muitos anos atrás. Estava de visita a um casal de amigos, numa cidadezinha antiga de Goiás. Enquanto passeavam pela cidade, deparou-se com uma casa, cujo quintal estava cheinho de pés de jabuticaba! Ficou maravilhada! Imediatamente dispôs-se a pedir permissão à dona da casa para experimentar as frutinhas pretinhas, de tão maduras. Porém, os amigos não a encorajaram muito. Segundo eles, a proprietária daquele paraíso não era lá muito afeita a agrados. Mesmo assim, decidiu arriscar-se. O máximo que poderia acontecer era receber um não! Passou-se um tempo até que uma senhora apareceu à porta. Assim que constatou que não era alguém conhecido, fez cara de poucos amigos. Com o firme propósito de ser atendida, fez o pedido lançando mão de toda sua simpatia. Mesmo assim a senhora não mudou de expressão e deixou claro que não vendia, não alugava e nem gostava de ver ninguém que não fosse previamente convidado a saborear suas frutas.
- E agora? Ela até salivava, de frente para a fisionomia carrancuda, enquanto vasculhava a mente em busca de uma ideia salvadora. Mentalmente lembrou-se da brincadeira de infância “gostosuras ou travessuras?” e sorriu para si mesma.
- Puxa, é que eu estou grávida – soltou num ímpeto. Sou doidinha por jabuticabas!
A mulher, surpreendida, olhou imediatamente para seu abdome magro, onde não viu qualquer volume que indicasse uma gravidez.
Ao acompanhar o olhar averiguador, ela ainda tentou estufar a barriga para fora mas, antes que a outra dissesse alguma coisa, completou:
- Estou com dois meses apenas – e acompanhou a fala com um olhar suplicante. Pronto, estava dito! Quase fechou os olhos para só ouvir a negação! Um silêncio incômodo se seguiu. Percebeu então que, ainda que pairasse uma dúvida sobre sua afirmação, a senhora recuou. Afinal, negar o desejo de uma mulher grávida é sempre um ato abominável, não importam quais sejam os costumes pessoais. Depois de alguns segundos, que pareceram uma eternidade, a dona da casa cedeu, ainda que a contragosto. Assim, ela e os amigos foram encaminhados ao quintal, com muitas recomendações e proibições.
- Só podem experimentar desse único pé! Os demais estão reservados para familiares que vão chegar – disse ela categórica!
Ela olhou para o pé quase pelado e, mesmo assim, seus olhos brilharam diante da promessa doce. Começou a pegar uma daqui, outra dali, timidamente, mas, assim que a dona da casa deu-lhe as costas, subiu rapidamente no pé. Logo, já estava lá em cima, onde seu aprendizado lhe ensinara que ficavam as frutas mais doces.
Seus amigos riam e conversavam sobre a aventura. Ela nem falava. Aliás, mal respirava! Precisava aproveitar bem a oportunidade!
Estava assim, totalmente envolvida na ação, quando a voz da dona da casa se fez ouvir, quase saída do nada:
- Não é perigoso você estar ai em cima, já que está grávida? Pode cair e machucar o bebê.
Apanhada de surpresa, ela balbuciou uma desculpa e sorriu sem graça.
- Eu fui subindo devagar e, quando me dei conta, já estava aqui em cima.
Mas, a dona da casa não se mostrou amigável e continuou plantada no lugar, como anunciando que a degustação já estava encerrada. Imediatamente, todos se dispuseram a ir embora.
Nesse momento sentiu toda sua alegria inicial se desfazer, ao dar-se conta da situação delicada em que envolvera a todos. Ao chegar à porta, aproximou-se da velha senhora e lhe deu um abraço carinhoso! Entre lágrimas, desmentiu sua pequena mentira, mas também contou sobre a paixão que nasceu na infância e os costumes mineiros. Mesmo sabendo que não tinha agido corretamente, queria expressar o quanto a generosidade dela a fizera feliz!
Surpreendida pela sinceridade e delicadeza de suas palavras, a senhora baixou a guarda - retribuiu o sorriso e o abraço. Em seguida fez o convite para que voltasse no próximo ano e sempre que quisesse. Ela iria reservar um pé de jabuticaba todinho, especialmente para ela!
Saiu dali refletindo sobre o ocorrido. Podia afirmar que todos haviam aprendido alguma coisa com aquele episódio. E a certeza que a verdade, quando dita da forma correta, abre novas possibilidades.
Porém, voltando às saborosas pretinhas, confirmou para si mesma que seu oferecimento cria a oportunidade para aquele que a possui, de ser generoso com os menos favorecidos pela natureza, literalmente! Para si mesma, a oportunidade de matar a vontade e a saudade da infância, lá nas serras de Diamantina!
Assinar:
Postagens (Atom)