Ainda me lembro do tempo que eu era criança e minha mãe usava um código para sinalizar que ninguém a interrompesse, quando precisava concentrar-se em alguma de suas costuras mais elaboradas. Sua voz afinada elevava-se no ar, preenchendo os espaços da escala musical suavemente, com os sons nostálgicos de alguma melodia antiga. Ela cantava de maneira tão bela que nada e nem ninguém ousava interromper aquele momento! Assim, sua voz imperava soberana, sobrepondo-se a todos os outros sons característicos de mais outro entardecer.
Se estava brincando por perto, parava tudo que estivesse fazendo para escutá-la. De uma forma que não conseguia explicar, sentia que seu canto saía do mais profundo de seu ser, mesmo que a minha mente incipiente de criança ainda não pudesse compreender o significado das palavras, ou os anelos do ser que as expressava. Meus ouvidos apenas acompanhavam os sons que tocavam meu coração! Simplesmente deixava-me envolver por uma doce emoção, que ia muito além do que a minha pouca idade tinha condições de verbalizar.
Hoje, arrisco-me a dizer que talvez sua voz despertasse em mim a saudade de um passado longínquo e feliz, anterior a essa vida. Ou, quem sabe, a intuição de obstáculos que enfrentaria no futuro, aos quais não teria como evitar e nem a teria por perto para ajudar-me a vencê-los.
Assim, mesmo que a minha alma ainda não consiga determinar, com toda a certeza, os motivos para a emoção que me envolvia, meu espírito certamente conhece suas origens. Quanto aos seus objetivos, permanecem guardados como fragmentos de vida na caixa imaterial da existência. Certamente para provar que todos os instantes da vida, por singelos que sejam, guardam em si um segredo, que nem sempre e nem todos conseguem revelar.
Um comentário:
Realmente, nada acontece por acaso. Para tudo que vivenciamos há um porquê, uma finalidade, uma explicação - aparentemente complexos à razão, mas perfeitamente compreensíveis ao coração!
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