Por vezes, só por vezes, eu me canso de esperar pelo melhor, de amar sem ser amada, de confiar, apesar de tantos desenganos, que dias melhores virão. Diante da janela da minha vida, olho o tempo que passa e leva para longe quem não volta para mim, o sol que nasce e que se põe, a chuva que cai e encharca a terra, a lua que brilha como um farol na escuridão. Por vezes, quero parar de procurar por mim, enquanto estou perdida entre os fatos que não controlo, entre as palavras que calo e aquelas que não ouço, quem eu quero, dizer para mim. Por vezes, só por vezes, eu me sinto fora do mundo, enquanto acompanho o mundo que não me vê.
E quando tudo parece não ter mais jeito, pequenas alegrias me chamam de volta. Ora é o abraço de uma criança, um sorriso puro de intenções, um amigo que estava longe e que lembra de mim. Nesse instante eu penso que, afinal, nada é tão mau assim. É então que eu me retomo, recomeço de onde parei, tiro a roupa da tristeza, livro-me das garras que me prendiam ao medo de não ser. Abro os olhos e vejo que o sol brilha, que a terra gira, que a vida é um presente que recebi, apesar de nem sempre fazer por merecer. E que há um amor que permeia tudo, que permite que cada dia seja como permito ele ser. É então que esqueço tudo o que pensei e que acreditei que estava ruim. Viver é muito mais que esperar por dias melhores, muito mais que o amor que não me quer, mais do que desejar que a vida se canse de mim. É fazer acontecer, mesmo que ainda não saiba o caminho que devo trilhar. É agradecer quem eu sou, agradecer quem poderia ter sido e não consegui ser. Agradecer o que tenho e esquecer o que perdi, pois o que perdi já estava perdido de mim, sem eu saber...
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segunda-feira, 7 de janeiro de 2013
Lembranças de Natal II
A saudade chega junto com a chuva que cai do céu e espalha no ar o cheiro de terra molhada, que se mistura com o aroma de café que chega da cozinha. O som familiar de trovões desperta a mente ainda sonolenta e faz desistir de voltar a dormir. Os pensamentos chegam e passeiam para lá e para cá, cada um contando sua história, relembrando outros momentos semelhantes, vividos em terras mineiras. Eles levam por caminhos já percorridos, devolvendo, por alguns instantes, uma doce sensação de familiaridade. O tempo só passa do lado de fora. Do lado de dentro tenho a idade e vivo no tempo de vida que desejo viver, em harmonia com pensamentos e sentimentos.
Relembro outras natais, outros anos novos, que hoje são velhos, que já passei aqui. A casa cheia reunia todos os filhos, vindos de vários pontos, para celebrar a passagem das festas de final de ano. Como a família era bem grande, não era preciso convidar ninguém de fora para fazer uma festa, mesmo que os amigos não resistissem à alegria e fossem chegando para fazer uma boquinha na ceia farta, posta sobre a mesa.
Reuniam-se todos ali: pai, mãe, filhos, agregados, netos e até bisnetos, depois de alguns anos. O cheiro do café da manhã, das comidas variadas para atender às diversas preferências, também se espalhavam no ar, misturados com o som das risadas, choros e brincadeiras de crianças, conversas sussurradas e as outras trocadas para todo mundo ouvir. Era sempre um alegre reencontro! A voz da mãe por vezes se elevava para chamar um dos netos ou uma das filhas, para ver o que estava se passando com as crianças. O pai, menos falante, se manifestava por monossílabos e pausadamente, sempre com uma palavra de amor velado, que acreditava, ninguém iria perceber...
Foram outros tempos, outros natais, outras passagens de ano. Se nem tudo era perfeito, a alegria de ter toda a família reunida compensava as pequenas diferenças.
Hoje, outros chegaram, muitos outros já partiram. De igual, fica o amor entre os que ainda permanecem por aqui. Fica o cheiro da chuva sobre a terra, o aroma que se espalha do café. A novidade de hoje é a saudade de outras pessoas que já não podem comparecer.
Feliz Vida Nova!
Para que o ano seja novo, não basta mudar o dígito no calendário. Não bastam os votos trocados, a roupa nova, as celebrações preparadas, os fogos coloridos no céu. As mudanças devem ser mais profundas para que seja possível limpar velhos hábitos e aquelas imagens que ficaram congeladas em um ponto qualquer da vida, que ainda não conseguiu dessintonizar. O ano só torna-se novo quando a vida se renova nas atitudes, nas ações e não apenas nos planos que, muitas vezes, não passam do estágio das intenções. É necessário girar o timão do barco da vida e conduzir-se “por mares nunca antes navegados”. Dizer as palavras nunca antes pronunciadas, fazer o impensável em outros tempos, ousar sair dos limites impostos por crenças indesejáveis que mantêm em uma eterna prisão.
É preciso gestar este ser novo para que ele possa nascer para outras realizações, novas alegrias, uma nova concepção de humanidade, de mundo e de si mesmo. É preciso deixar para traz todo o velho que já não merece repetição. Renovar a vida de dentro para fora, para mudar a vida de fora para dentro. Afinal, quem faz um ano realmente novo sou eu, é você, somos todos nós!
Lembranças de Natal I
Naquele Natal ela já havia feito 5 anos! A árvore viva foi cuidadosamente plantada dentro de uma lata decorada com papel crepom verde e colocada a um canto, na ampla sala de jantar. Sob as mãos habilidosas da irmã mais velha, o que era apenas um pinheiro comum começou a adquirir identidade própria – tinha um toque de sonhos, de novas esperanças e uma pitada de magia. As bolas brilhantes coloriam os galhos verdes, alternadas com estrelas, sininhos, pacotinhos que imitavam presentes, anjinhos delicados, bengalinhas listradas em vermelho e branco e pequenos bonecos de papai noel. No alto, uma ponteira dourada finalizava brilhantemente o arranjo!
A alegria de montar a árvore de Natal contagiava a todos os membros da família! As crianças menores tinham a função de prender pedacinhos de algodão nas folhas pontudas, para imitar flocos de neve. Neste afazer aconteciam espetadas dolorosas nos dedinhos delicados, que provocavam algumas lágrimas e bolas frágeis partidas pelo chão. Mas, o importante para elas era fazer parte dos preparativos, embora a ajuda se limitasse até onde as mãozinhas pequenas alcançavam.
Quando a árvore ficava finalmente pronta, a beleza da transformação era confirmada pelo brilho nos olhos atentos. Depois dessa parte, chegava o momento de escrever as cartinhas para o Papai Noel. Uma das irmãs mais velhas anotava no papel os pedidos das duas meninas menores, cujos olhinhos brilhavam, antecipando a alegria dos presentes.
Certo dia, faltando pouco para a data, a irmã maior foi segredar para a menorzinha que havia descoberto uma coisa grave, mas que ela deveria jurar que não contaria para ninguém. A mãe já havia avisado para não entrarem na sala de visitas, até que ela permitisse. Entretanto, alguém esqueceu a chave na porta e a menina maior, curiosa, entrou para ver o que tinha lá. Diante da descoberta, queria levar a irmã para ver com seus próprios olhos. Entraram sorrateiras no cômodo na penumbra e, diante das caixas empilhadas, a maior levantou a tampa de algumas delas, deixando ver duas lindas bonecas e outros brinquedos, tal como elas haviam pedido para o Papai Noel...
Triunfante, sentenciou:
- Eu já não tinha te falado? Papai Noel não existe!!!
A menorzinha arregalou os olhos e começou a choramingar, mas a maior ameaçou: se a mãe descobrisse a traquinagem elas poderiam ficar de castigo ou até mesmo não receber os presentes. Sem alternativa, a menor engoliu as lágrimas, com o coração apertado. Não queria acreditar no que a irmã falou.
Esperou ansiosa que o natal chegasse. Antes da meia noite, colocou seu melhor sapatinho na janela e foi dormir. Os adultos diziam que, se estivesse acordada quando o Papai Noel passasse, não receberia seu presente. Ainda assim, foi difícil conseguir dormir, tal era sua ansiedade...
Na manhã seguinte acordou bem cedo e foi correndo abrir seus presentes. Diante de seus olhos estava a mesma boneca que havia visto através da fresta da caixa. Como havia prometido para sua irmã, guardou o segredo, mas, naquela manhã de Natal, a ilusão e a magia do sonho se desfizeram em seu pequeno coração pela primeira vez!
Ainda bem que na vida nada é definitivo. Sem roupas vermelhas, sem gorro, sem barba branca, sem renas e sem trenó, com o passar dos anos ela comprovou que seu presenteador era de carne e osso e tinha por ela um amor muito maior e mais verdadeiro que qualquer ilusão colorida! E descobriu que, afinal, os sonhos podem ser mantidos sem que seja necessário afastá-los da realidade...
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