Ela sempre guardara para si seus sonhos e alguns
pequenos segredos, que não contava para ninguém. Pelo menos, não integralmente.
No máximo deixava escapar um pedacinho aqui, outro acolá, de preferência para
pessoas diferentes, para que ficasse difícil reuni-los ou identificá-los por inteiro.
Confiava que dessa maneira poderia mantê-los resguardados e protegidos de
pensamentos e observações alheias, até que conquistassem a chance de se
materializar ou se revelarem por si sós.
Como boa estrategista, de tempos em tempos
ela os enfileirava na mente, para revisá-los. Outras vezes, como uma mãe
cuidadosa, dedicava-se a alimentá-los, medi-los, pesá-los. Um ritual que demandava
tempo e muita calma, para não acontecer qualquer avaliação precipitada. Acontecia
ocasionalmente de um ou outro sonho se materializar, ficando grande demais para
continuar em segredo. Era então transferido para outro compartimento mental, periodicamente
revisitado, para estimular a realização dos demais. Era tudo assim, certinho e
subdividido. Cada assunto no seu lugar e cada lugar com aquilo que lhe era
afim, de preferência bem protegidos e isolados de tudo e todos que pudessem prejudicá-los.
Mas, aquela troca de olhares foi tão inesperada
que pegou todos os seus cuidados e reservas desprevenidos. Cansada de esperar o
futuro, resolveu desfrutar a alegria daquele presente e se deixou levar pela
leveza do instante. Afinal, aquela era uma brincadeira inocente que poderia ser
lembrada em algum momento de nostalgia. Só não sabe ao certo quando tudo começou
a mudar dentro de si. Quando foi exatamente que começou a deixar cair seus
medos, esquecer suas reservas e chamar para fora a mulher que mantivera
escondida dentro de si. Simplesmente misturou e soltou seus sonhos, esqueceu
seus segredos, retirou pesos e medidas, reduziu cobranças desnecessárias. Hoje
se alimenta especialmente de suas alegrias e do prazer de viver o que a faz tão
feliz!
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